Bairros de lata na Grande Lisboa Sim, existem
Muitos se recordam da vergonha e do desconforto que sentíamos, quando entrávamos em Lisboa, vindos do norte, e nos deparávamos com bairros de lata onde a degradação urbana e a pobreza das pessoas que ali viviam era evidente. Muito se fez nos anos 90 para contrariar essa tendência, na criação de bairros sociais que efetivamente alojaram milhares de pessoas, mas que criaram novos problemas cujas consequências hoje em dia estão à vista. Assim, alguém que não conheça a atual realidade, pode pensar: não existem mais bairros de lata em Lisboa! Mais, não há mais barracas na Área Metropolitana de Lisboa, construídas de forma desordenada e onde a pobreza, falta de higiene e a insegurança são a consequência natural deste contexto.
Lamentamos informar, mas não! É uma situação que permanece! Não talvez em Lisboa, concelho, mas por toda a Área Metropolitana de Lisboa, em particular no de Almada. Desde que Inês de Medeiros, do Partido Socialista, assumiu a presidência da Câmara Municipal de Almada em 2017, e com a conivência do PSD, veio ao de cima a sua incapacidade em lidar com os problemas estruturais de Almada, sobretudo no que diz respeito à habitação e ao crescimento de bairros clandestinos. Enquanto a CDU deixou a sua marca de negligência ao longo de quatro décadas, com o crescimento dos bairros do 2.º Torrão e das terras de Lelo Martins (vulgarmente conhecido por Terras da Costa), e o BE promove a ocupação ilegal de casas municipais para beneficiar de narrativas políticas e manipulação de eleitorado, o atual executivo PS agravou a situação, permitindo o descontrolo total em bairros como a Penajóia e tratando de forma desumana as populações vulneráveis nos outros dois bairros.
Recentemente e apenas por motivos de segurança, devido ao risco de derrocada de parte do bairro, parte da população do 2.º Torrão teve de ser realojada. A abordagem de Inês de Medeiros no realojamento das famílias do 2.º Torrão foi marcada pela pressa, pela insensibilidade e pela falta de planeamento. O PS, sob o pretexto de garantir a segurança pública, avançou com demolições apressadas em 2022, deixando dezenas de famílias desalojadas ou colocadas em habitações temporárias longe das suas redes de apoio. O mesmo padrão de negligência verificou-se nas Terras da Costa, onde o problema da precariedade habitacional permanece inalterado. Este governo local falhou em tratar estas populações com dignidade, preferindo uma abordagem cosmética que privilegia o “apagar de fogos” mediáticos, ao invés vez de soluções reais e integradas.
Porém, o maior símbolo da incompetência da liderança socialista é, sem dúvida, o bairro da Penajóia. Nos últimos anos, o bairro cresceu de forma desordenada. O município assistiu de forma impávida e serena ao crescimento de construções clandestinas. Imagine-se o efeito perverso de, no próximo ciclo eleitoral autárquico, abordar a população da Penajóia com a promessa de novas casas quando, na verdade, a CMA teve a oportunidade de estancar o problema. É desconcertante. Na semana do Natal de 2024, a falta de eletricidade no bairro expôs a verdadeira face do desleixo do executivo PS: famílias deixadas ao frio, numa altura crítica do ano, sem respostas nem assistência.
Apesar de estar localizado em terrenos do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), é à Câmara que cabe a responsabilidade de fiscalizar, coordenar e intervir. No entanto, Inês de Medeiros e o seu executivo têm assistido passivamente à expansão descontrolada da Penajóia, permitindo que o bairro se transforme num exemplo de exclusão social e falta de dignidade humana.
Esta inação do PS contrasta com as promessas eleitorais de mudança e modernização. Em vez disso, o mandato de Inês de Medeiros, acolitada pelo PSD, ficará marcado pela incapacidade de tomar decisões corajosas e eficazes para resolver um problema que não pode mais ser ignorado.
Perante este cenário, Almada precisa urgentemente de uma visão política que vá além da mera gestão do presente. É preciso pensar em quais as respostas que o município pode dar a uma população que dificilmente terá meios para, no curto prazo, entrar no mercado da habitação. A política de construção de bairros sociais, verdadeiros guetos, é insuficiente no que diz respeito à integração das pessoas na comunidade. Assim, importa estimular parcerias público-privadas para requalificar áreas degradadas, sem sacrificar o direito à segurança e à habitação digna, mas que responsabilize, ao mesmo tempo, os moradores pela falta de civismo e até vandalização do edificado.
Igualmente, os serviços municipais, suportados com os impostos dos munícipes, da mesma forma que fiscalizam e obstaculizam as centenas ou milhares de vivendas que estão a ser construídas de forma legal em Almada, devem ser direcionados para impedir o crescimento dos atuais bairros e o surgimento de novos. Com isto, os agentes públicos que falham em cumprir o seu papel devem ser responsabilizados. Os realojamentos que ocorrerem, de forma a não criarem novos guetos, devem prever o acesso a transportes, saúde, educação, e, sim, segurança. A ausência da autoridade do Estado, naquilo que este é realmente necessário, a saber, a proteção das pessoas e dos bens públicos e privados, é o que produz episódios de violência como os que assistimos recentemente em toda a Grande Lisboa, também em Almada, mais concretamente no Monte da Caparica. Não podemos cair nos mesmos erros e daqui a alguns anos nos chocarmos com episódios de violência que ocorram em novos guetos.
Por fim, dar espaço para a criação de oportunidades para que as populações vulneráveis possam ascender social e economicamente, e isto faz-se, a médio/longo prazo, por via da educação, mas, no curto prazo, no apoio à criação do pequeno negócio local. Seja pela responsabilidade de manter um imóvel, seja pela responsabilidade de gerir um pequeno negócio que permita o sustento do seu dono e de mais alguém da comunidade local, esta é a forma mais eficaz de criar um dinamismo e uma consciência tal que ajudará a integrar as pessoas e desviar muitos da exclusão e da criminalidade.
O que foi descrito para Almada, poderia ser descrito para outros concelhos da Área Metropolitana de Lisboa, pois a realidade é a mesma. Substituir Almada por Seixal, Loures ou Amadora não resultaria num texto muito diferente. Tal deve-se a um traço comum – as políticas locais falhadas do PCP e do PS, que, desde o 25 de Abril, governam estes municípios, alternando a negligência de uns com a incompetência de outros. À gestão do PCP em alguns destes concelhos, sucederam-se executivos do PS que perpetuaram problemas e assistiram, de braços cruzados, ao colapso da dignidade habitacional nestes concelhos. Só uma nova abordagem, assente na responsabilidade política dos eleitos, das pessoas e na liberdade individual destas, poderá reverter um cenário que, tal como no passado, mas talvez mais escondido, nos envergonha a todos.