Carta Aberta ao Mundo do Futebol Português

Aproximamo-nos de um momento decisivo nas eleições para os órgãos sociais das  duas instituições que gerem o desporto que mais amamos. Este é um convite à  reflexão sobre o estado do nosso futebol, focando essa reflexão, não apenas nas  conquistas, mas também nas inúmeras oportunidades de crescimento e melhoria  para a vida dos adeptos e amantes da modalidade.

Nos últimos anos, o futebol português apresentou um crescimento acentuado,  com conquistas e com campanhas internacionais muito interessantes, mas ainda  sobram desafios que precisamos superar para nos colocarmos ao lado das grandes  ligas mundiais. Somos um país pequeno, é verdade, com limitações financeiras e  sociais, mas, acima de tudo, somos um povo apaixonado pelo desporto-rei.

É hora de redirecionar o foco. Embora a discussão sobre os milhões que envolvem  o negócio do futebol seja frequente, e por vezes necessária, o verdadeiro motor das  instituições, tanto da FPF quanto da Liga Portugal, deve ser os nossos adeptos, os  sócios, o espetáculo em si e, claro, os grandes artistas que encantam os relvados.

Como é possível, em 2025, ainda termos jogos a horários que afastam as famílias  dos estádios? Não podemos continuar a usar as operadoras televisivas como  escudo para críticas. Se os nossos estádios estiverem cheios, com bancadas  repletas de cachecóis e camisolas, será que as operadoras não vão querer registar  a euforia desses momentos? Faz sentido ter jogos às 20h45, quando poderíamos  realizá-los às 14h ou 15h, como nas melhores ligas europeias? Será que alguém  deixaria de assistir a um jogo da Liga Portugal apenas porque este começa às 14h,  em vez das 20h30?

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É urgente que o futebol retorne a horários que respeitem a vida familiar dos adeptos.  As crianças querem ir ao estádio, as famílias desejam viver a magia do futebol  enquanto exploram as belezas de Portugal. Queremos estádios cheios, queremos  poder ver o nosso clube por todos os estádios deste país.

E o problema vai além dos horários. A venda de bilhetes para certos jogos e  competições é inaceitável: opaca, cheia de incertezas, provoca desconfiança e  deixa os adeptos em segundo plano. Este é um problema que os clubes devem  resolver, mas é responsabilidade da FPF e da Liga Portugal regular, gerir e fiscalizar  a venda de bilhetes de forma transparente. É imprescindível acabar com a  desconfiança em relação aos bilhetes “dados” a claques, parceiros e amigos. Que  haja seriedade! É hora de exigir que cada clube informe a quantidade de bilhetes  distribuídos, vendidos e os retidos para convites. Que haja transparência!

Reconheço que implementar essas mudanças pode ser desafiante e incomodar  certos “poderes” no futebol. No entanto, as instituições que cuidam do nosso  futebol precisam de ter coragem para se posicionar sobre o futuro do futebol em  Portugal.

O futebol deve ser um verdadeiro espetáculo! Temos talento – jogadores incríveis,  treinadores competentes, infraestrutura de qualidade. Mas chegou o momento de  FPF e Liga Portugal assumirem plenamente o seu papel, colocando o prisma do  adepto em primeiro lugar e não apenas o prisma financeiro. Valorizar os adeptos e  não só as contas cheias.

Existem muitas questões que poderíamos discutir nesta carta, como a  necessidade de um lobby junto dos nossos deputados para revogar a proibição da  venda de bebidas alcoólicas nos estádios durante jogos profissionais ou a reflexão  sobre a própria estrutura da Liga Portugal que deverá deixar de estar no controlo dos  clubes para ser uma verdadeira instituição independente, autónoma e que proteja  os interesses de todos os intervenientes do futebol português – basta seguir o  exemplo da Premier League.

O que desejo, com esta carta, é que os candidatos aos órgãos sociais da Federação  Portuguesa de Futebol e da Liga Portugal deixem os seus pedestais e vejam a  realidade através dos olhos de um adepto, de um apaixonado pelo futebol. É hora  de implementar as mudanças urgentes que precisam de ser feitas para que o nosso  futebol cresça. Para que os estádios fiquem cheios, para que, ao final das contas,  o negócio do futebol prospere, beneficiando adeptos, sócios, clubes, a Liga  Portugal, a FPF e, em última análise, todo o nosso querido Portugal.

Chegou a hora de agir! De sermos melhores! De privilegiar a festa, o espetáculo, as  bancadas cheias, a transparência, as pessoas. Precisamos que os candidatos  pensem e se posicionem firmemente para que todos possamos continuar a vibrar  e a celebrar nos estádios.

Com paixão pelo futebol,

Um amante do desporto

Um wokismo transversal

É comum associar o wokismo a ideias1 completamente disparatadas2, tipo homens3 poderem engravidar4, de uma esquerda que, órfã5 da classe6 operária, procura sobreviver vendendo novos produtos a outros mercados. Como qualquer feirante sabe, há sempre clientes para novidades absurdas, se bem que o mercado rapidamente se sature de cada uma delas e passe para a moda seguinte.

De uma perspetiva warxista7, este é o grande problema da democracia burguesa: funciona como se um mercado político fosse, se não com competição perfeita, pelo menos com competição oligopolista, o que obriga os partidos e movimentos progressistas a terem que estar continuamente a desenhar, promover & vender novas injustiças e insatisfações. A chamada ditadura do proletariado, uma tirania8 dirigida & gerida por bons buroburgueses9, evitaria ao warxismo todo o stress eleitoral e a necessidade de estar sempre a desenhar e vender novas bugigangas ideológicas, conhecidas como wokismo identitário. Dois exemplos da estabilidade política proporcionada pela ditadura do proletariado são a República dita Popular de China e a Koreia dos Kims do Norte, onde, devido a restritivas cotas à importação ideológica, o wokismo identitário não tem mercado.

Há, no entanto, algumas ideias tão disparatadas, como aquela de existirem 68+ géneros, que não são apropriadas exclusivamente pela esquerda, mas que são partilhadas transversalmente por todo o espetro político nacional. Uma delas, comum do BE ao Chega, passando, com vários matizes, pelo ps/d e Iliberal é que, ao revés de toda a evidência, o estado tem uma função estabilizadora não só nos ciclos económicos, mas também na paz & equidade social, através das suas políticas tributárias & de despesa pública, dos seus regulamentos & aparato burocrático. É o wokismo económico.

O wokismo económico tem uma fundamentação tão sólida na realidade como o identitário. Por exemplo, será que as recessões económicas e as crises financeiras diminuíram de frequência e intensidade com o progressivo aumento da carga fiscal, regulamentação, compliance & disclosure? E será que violações, suicídios, pobres10, greves, divórcios, drogados e abortos são menos numerosos quando os subsídios, as transferências11 e outros apoios sociais aumentam? A evidência da história social e económica dos últimos dois séculos e das estatísticas económicas e sociais disponíveis dão uma resposta clara: não! Antes pelo contrário: a disfunção social e o crime aumentam com o crescimento da burocracia estatal e a solidariedade pessoal e grupal diminui com a carga fiscal. Daí haver quem defenda que a tributação deva ser voluntária e facultativa.

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Então porque é que será que tanta gente vai atrás destas políticas da carochinha do wokismo económico, vulgarmente conhecido como neokeynesianismo? Pela mesma razão que acreditam que a matemática é um instrumento de opressão racial ou que para haver equidade de género é preciso que haja tantas mulheres quanto homens no parlamento & na prisão12, nos conselhos de administração & na recolha do lixo. A que se junta uma certa beleza da teoria, galardoada com um Nobel da Economia em 1981 na pessoa de James Tobin (1918—2002), em reconhecimento dos sucessos da política económica neokeynesiana nos EUA e Europa nos anos 70, com inflação galopante, crescimento económico baixo, conflitualidade laboral e social rampantes, bem como criminalidade galopante.

Mas enquanto o wokismo identitário foi rapidamente reconhecido como um disparate que ajuda a esquerda a perder votos13 fora da bolha14, o wokismo económico, a crença de que a intervenção do estado e que a sua legislação tem um papel benéfico & estabilizador na economia, continua popular entre os nossos políticos e cidadãos15. Assim, a nossa direita nunca diz que quer menos estado na educação, na saúde ou na economia. Diz é que quer um estado mais eficiente. Mas mais eficiente em relação a quê?

Se o padrão for a ineficiência que atualmente temos, nem será difícil melhorar, bastará passar de vez em quando o nosso governo de uma fação do ps/d para a outra, do eng. Costa para o dr. Montenegro. Mas se o padrão de eficiência e qualidade for colocado ao nível de uma educação e uma saúde que se poderiam obter com um estado mínimo, quer como provedor, quer como regulador, como existia em Hong Kong pré-1997, então o que é necessário não é um estado mais eficiente. É menos estado.

De modo semelhante, se quisermos uma economia dinâmica, vibrante, e aberta à participação de todos, na medida que cada um queira participar, então também não chegaremos lá com um estado “mais eficiente”, mas com menos estado, com menos regulações, menos subsídios e menos impostos. Não será com o wokismo neokeynesiano da nossa direita, mas com uma motosserra à la Javier Milei.

Us avtores não segvew as regras da graphya du nouo AcoRdo Ørtvgráphyco. Nein as du antygu. Escreuew covmv qverew & lhes apetece. #EncuantoNusDeixam

  1. Ideia: produto da atividade química que ocorre no cérebro & que está dependente da atividade química que é processada no estomago; de onde se deduz que a pureza ideológica do warxismo requereria uma dieta única para todos os militantes, uma ideia fundamental de que nem Warx, Engels ou Lenine estavam cônscios; o que define um idiota.
  2. Disparate: qualquer objeção simplista16 ao excelente argumento apresentado neste artigo ou ao léxico a ele anexo.
  3. Homem:uma das duas configurações com que que os Homens vêm a este mundo, nus para evitar confusão na classificação, verificável nos órgãos reprodutores e determinada pelo DNA; uma teoria filosófica sebosa e cerebrosa recente nega que esta divisão se fundamente corporeamente no baixo abdómen mas que se encontra realmente no córtex pré-frontal em dois neurónios de tipo x e y que determinam o sexo; pessoa com características estruturais, funcionais e comportamentais inferiores à média; no hétero-patriarcado branco, aquele que serve de sustentador e provedor, sendo classificado como ‘bom’ ou ‘mau’ com base na capacidade da mulher vestir Chanel ou outro trapo de marca; membro da espécie animal Homo Sapiens, espécie que, nos intervalos em que trabalha pela extinção dos seus semelhantes, se ocupa da preservação das outras, como sapos, cobras e lagartos; apesar de todos os esforços para se autoextinguir, a espécie prospera com tanto vigor que já infeta toda a terra habitável e a Espanha, pondo em causa a sustentabilidade ecológica da mãe terra; membro daquela espécie animal que, ao contrário de todas as outras, incluindo felinos e canídeos, se preocupa mais com aquilo que quer ter ou quer parecer do que com aquilo que deve ser; elemento da única espécie conhecida que é geradora do artificial, da artificialidade, do que não é natural e do que é antinatural, de onde se destaca o ekologismo, o warxismo e o wokismo; Humanidade, isto é, homens e mulheres, se bem que algumas escolas de pensamento, como o Budismo, considerem que só homens podem ser homens e que só eles têm acesso ao Jōdo 浄土, o Paraíso da Terra Pura, sendo que as mulheres têm que reencarnar antes como homens neste mundo para depois lá poderem serem admitidos. Como será operada a reencarnação da última mulher como homem, para poder ter acesso ao paraíso de Amida, é uma questão que ultrapassa a competência e não cabe no estreito vaso do engenho deste lexicografo.
  4. Engravidar: resultado de um trabalho de equipa de dois que às vezes é ilicitamente apropriado como pertencendo a apenas a um deles com base em argumentação woke; condição usualmente de baixa gravidade; situação de baixo risco que é coberta e protegida pela apólice matrimonial.
  5. Orfão: jovem que foi privado do seu direito à preocupação paternal e à desobediência filial.
  6. Classe: construção ideológica do hétero-patriarcado novecentista germânico, perpetuada nos estudos sociológicos contemporâneos, mas sem qualquer correspondência à realidade jurídica ou administrativa que estrutura a nossa vida social, uma vez que não existem leis que estabeleçam ou regulem as supostas classes sociais, nem registos ou certidões que as certifiquem ou comprovem, conceito que é, no entanto, e apenas, implicitamente admitido nos chamados “escalões” do código do irs. Curiosamente nenhuma força política nacional defende a abolição deste abjeto resquício do classismo, que pretende subrepticiamente impor, contra os princípios constitucionais, a desigualdade na nossa sociedade.
  7. Warxismo: sistema político que faz guerra ao que é bom, belo e verdadeiro na Humanidade; ideologia que vê a realidade natural e social ao contrário, de pernas para o ar, tal como um M a fazer o pino; filosofia política que confunde as caraterísticas essenciais com as acidentais, e vice-versa. Os warxistas clássicos são militantes do pc; os neo-warxistas estão filiados no ps, bloco e ILiberal.
  8. Tirania: sistema político adotado pelos povos que preferem a praga do despotismo (vendido pelo BE) à pestilência da anarquia; sistema político cujo objetivo é alimentar os apetites dos tiranos com a carne do povo; é politicamente tão forte quanto os aparelhos digestivo, cardiovascular e respiratório do tirano, o que lhe confere uma poética e prática fragilidade.
  9. Buroburguês: agente ou funcionário do aparato burocrático que gere as sociedades socialistas; apparatchik; burguês socialista, da descendência de Warx & Engels, que é membro do aparelho.
  10. Pobre: bem-aventurado, porque dele é o reino dos céus (Mt 5, 3); a inveja que os pobres e a sua bem-aventurança despertam nos abastados e ricos tem levado a inúmeras propostas e planos para a abolição do capital e da riqueza, uma das mais conhecidas e eficazes das quais será a da autoria de Karl Warx, um burguês bon-vivant que nunca trabalhou num campo ou numa fabrica, e cujas propostas asseguram a generalização da miséria e bem-aventurança a toda a população sempre que são aplicadas; alguém que, na profecia de Nosso Senhor (Jo 12, 8), teremos sempre no meio de nós, o que leva à questão: será que Deus, na sua misericórdia, se está a servir do warxismo — e du ps — para assegurar o cumprimento desta profecia no nosso país?
  11. Transferência: operação em que não há destruição de recursos, mas o seu aproveitamento legítimo, ou ilegítimo, por um terceiro tal como o desaparecimento de mercadorias de um armazém, obras de arte de um Museu, um estudo que para nada serve, em que a organização que o encomendou não ganha nada, mas o dinheiro que paga pode servir para quem o produziu e/ou vendeu comprar cerveja.
  12. Prisão: o estado social no seu apogeu; “Stone Walls do not a Prison make, / Nor Iron bars a Cage; / Minds innocent and quiet take / That for an Hermitage. / If I have freedom in my Love, / And in my soul am free, / Angels alone that soar above, / Enjoy such Liberty.” (Richard Lovelace (1618-1657))
  13. Voto: instrumento de um homem livre para obter & justificar a sua dependência & servidão a uma clique governamental; segundo uma teoria política do hétero-patriarcado branco helenístico, a decisão votada pela maioria assegura seu caráter ético e segundo uma teoria do hétero-patriarcado branco anglo-saxónico assegura a sua inerente legitimidade, duas teorias comprovadas, entre outras, na história eleitoral da Alemanha pré-guerra.
  14. Pelo menos parece ser essa a opinião de Seth Moulton, um democrata, membro do Congresso eleito pelo Massachusetts, que atribuiu a derrota eleitoral de Kamala Harris à adesão do partido democr@ta ao wokismo identitário: “Eu tenho duas filhas pequenas”, terá dito ao New York Times (disclaimer: este léxicografo não fez qualquer fact check a esta atribuição). “Eu não quero que elas sejam esmagadas, a jogar em campo, por um atleta que é homem, ou que já foi homem. Mas, como democrata, não é suposto que eu diga isto.” Esta declaração, de tal modo absurda, levou o gestor da sua campanha a renunciar ao cargo em protesto, um professor da Tufts University ameaçar bloquear os seus alunos de estagiarem no gabinete de Moulton no Congresso, e um presidente de um comité do seu partido no círculo eleitoral que representa a apelidá-lo de “colaborador nazista”.
  15. Cidadão: político a quem nenhum eleitor jamais recusou o seu voto, ao contrário do Prof. Marcelo; constitui, portanto, uma das reservas inexploradas da democracia.
  16. Simplista: a visão alternativa à aqui apresentada; um exemplo de simplismo é a afirmação de que “o mundo é demasiado complexo para explicações ou soluções simplistas.”

Uma Saúde para o Século XXI

Qualquer português hoje em dia com um seguro de saúde relativamente simples com ou sem cobertura dentária, consegue facilmente ter acesso a um médico, que esse médico possa solicitar os exames complementares que ache importantes, e que estes sejam realizados no tempo e no espaço de forma que rapidamente uma estratégia clínica possa ser delineada e prosseguida com ou sem a necessidade de referenciação para um ou mais especialistas.

Com base neste principio de eficiência para com os cidadãos que os subscrevem, a oferta de inúmeras seguradoras explodiu e na mais sã concorrência de mercado possível permitiu que em menos de 20 anos uma rede de clínicas e hospitais privados nascesse por todo o continente e ilhas, a abranger uma população de mais de 3,6 milhões de portugueses, e mais de 5 milhões se incluirmos os beneficiários da ADSE que funciona como um seguro “privado” dos funcionários públicos.

A Oferta neste momento é tão substancial que os recursos humanos mais valiosos dentro do SNS estão a ser sugados para o sistema privado, por condições salariais mais vantajosas e não só, como sejam a conciliação entre a vida profissional e a vida privada e familiar, entre muitas outras, que não são objeto de abordagem deste artigo. Por outro lado o consultório médico independente e desagregado de qualquer organização de saúde privada tende a desaparecer com o tempo, e,  apesar de ainda alguns resistentes médicos de maior estatuto, são uma realidade do passado que certamente nem sequer se coloca como perspetiva viável para a classe médica que se forma atualmente.

Infelizmente para o sistema privado e para o cidadão acometido com o infortúnio de um diagnóstico de uma doença grave e onerosa, os seguros de saúde tornam-se ineficazes com as coberturas a serem rapidamente ultrapassadas e com os doentes a acabarem por serem literalmente “despejados” no Serviço Nacional de Saúde em situações deveras dramáticas e complicadas. Por outro lado, os seguros de saúde não são muito eficazes ou são mesmo completamente ineficazes quando se está em presença de doenças crónicas, doenças oncológicas, doenças autoimunes e doenças raras que requerem tratamentos muito dispendiosos, completamente fora do alcance das coberturas e do comum dos mortais. Só o atual SNS o consegue fazer e sejamos claros e tenhamos orgulho em o dizer, de uma forma muito eficaz a tratar e a cuidar destes doentes.

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Os seguros de saúde são muito bons para quando estamos saudáveis e somos acometidos de alguma maleita aguda temporária relativamente fácil de cuidar, e muito limitados quando estamos muito doentes. São perfeitos instrumentos de saúde para nos mantermos saudáveis mas pecam por serem incapazes de ir para além da Taprobana.

O SNS fica assim refém de ter de tratar os mais vulneráveis e as pessoas incapazes ou que não querem ter de aceder a um seguro de saúde e os cidadãos acometidos das doenças mais graves com ou sem seguro e que constituem metade da população mais a população que tem seguro que terá de aceder ao SNS sempre que os seus plafonds de cobertura sejam ultrapassados.

Assim, quem não tem seguro é servido com o dinheiro dos impostos de todos, e quem tem seguro acaba por ter de recorrer ao SNS por incapacidade de cobertura do seguro que comprou, pagando duplamente em impostos e no seguro adquirido tornado desta forma incapaz.

Claro que estas coisas não são preto e branco, até porque muitos dos servidores do privado também trabalham no público e acabam por conseguir referenciar para o SNS muitos doentes complexos a necessitarem de medicação extremamente onerosa que não é possível servir no privado por impossibilidade dos seguros de saúde cobrirem nas suas apólices o acesso a medicamentos desta natureza. De forma alguma procuro aqui criticar este tipo de situações, apenas constatar o fato, e porque este tipo de “esquema” por muito legítimo que possa ser, tem sempre por detrás uma sensação intrínseca de que alguma injustiça está a ser cometida. É injusto e não se enquadra no espírito da Constituição da República Portuguesa, pois quem não pode submete-se aos caprichos da gestão do SNS, nomeadamente das listas de espera, e quem pode vai ao privado porque arranjou forma de poder pagar um seguro de saúde.

Os cidadãos saudáveis que não podem aceder aos seguros de saúde, por escolha ou por incapacidade financeira, não podem ficar assim sujeitos às dificuldades e caprichos do SNS, sem conseguir aceder atempadamente ao médico de família, e este, por sua vez, fica refém de um sistema em que a referenciação para outro médico ou para realização de exames tarda a agenda, provoca demoras, adiamentos e outro tipo de vicissitudes completamente desapropriadas quando estamos a falar em questões de saúde.

O direito à Saúde, consagrado na Constituição, deve pois materializar-se num Sistema Nacional de Saúde, de acesso universal e empoderado no indivíduo, na escolha do seu prestador, e servido por um sistema capaz de assegurar a saúde dos portugueses nos 5 níveis de atenção principais:

  1. Atenção Primária – e que deve ser de livre escolha por parte do utente, protagonizada pelos médicos e enfermeiros de família e onde todos possam escolher livremente o seu parceiro para a sua saúde onde quer que se encontrem, inclusivamente em centros integrados em unidades dotadas de serviços de saúde básicos e complementados por centros de análises, Rx, ecografias, centros de cardiologia, nutrição, psicologia entre outras valências, e porque não integradas também em centros de fitness e bem estar. A Oferta que se organize em face dos novos tempos e em total liberdade de quem possa e seja mister em providenciar esses serviços.
  2. Atenção Secundária – de livre escolha e em seguimento das referenciações dos médicos de família em atenção primária sempre que o utente precise de cuidados especializados e/ou exames complementares mais específicos e onde esses serviços possam ser prestados tão prontamente quanto os cuidados o exijam.
  3. Atenção Especializada – Centrados em centros de saber diferenciados onde a concentração de meios e de saber faça sentido e para onde todos os profissionais de saúde possam encaminhar os seus doentes que necessitem de serem atendidos atempadamente de forma multidisciplinar, seja na área do Cancro, das doenças crónicas, das doenças raras, e dos doentes que necessitem de intervenções complexas como transplantes de órgão, e outras doenças de complexidade extrema e onde o saber possa ser expandido, transmitido e aprendido, contribuindo para os ganhos em saúde de todos os portugueses, orientado para a sobrevivência de longo prazo e sem doença ou com doença controlada e com qualidade de vida.
  4. Atenção Urgente – Centrado no indivíduo acometido de situações que possam colocar em perigo a sua vida, numa rede capaz de responder atempadamente e contribuir para prevenir a morte e salvar vidas, estando estes centros integrados em centros de atenção secundária ou centros especializados. Aqui deve ser possível distinguir de forma clara as situação urgentes com perigo iminente para a vida humana das situações urgentes que não constituem esse perigo e que podem muito bem ser cobertas pelos centros de Atenção Primária e que se podem organizar inclusivamente para que estas situações possam ser integradas em visitas domiciliarias e que possam todas elas ser triadas e conduzidas pelos atuais centros de atendimento telefónico centralizados no INEM/112.
  5. Atenção Diferenciada – Paralelamente deve ser incentivado e regulado pelo Estado em concorrência saudável entre todos os prestadores , um plano que promova a existência de uma rede de cuidados para situações crónicas que requerem acompanhamento continuado incluindo doenças raras, centros especializados de hemodiálise (talvez o único exemplo onde a cobertura nacional é quase toda privada e financiada por acordos de parceria com o Estado), centros de tratamento e acompanhamento de doentes a necessitar de cuidados de saúde mental, centros de cuidados continuados, centros de cuidados paliativos e outras situações especificas de outra natureza que possam ser identificadas e que requeiram cuidados particulares de outra natureza, e que possam trabalhar em rede com centros de atenção primária, secundária, especializada e urgente.

Criar em paralelo as condições para toda a população investir grande parte do seu tempo livre numa cultura de atividade física contínua, anti ócio e vícios, incentivados de forma que as suas despesas com estas atividades possam ser descontadas na totalidade no IRS, pois sabemos que quanto mais ativos estivermos menor será a carga de doença nos Hospitais, menor o absentismo laboral, e mais saudável física e mentalmente estaremos todos.

E, obviamente, desde o nascimento até à adolescência e idade adulta deve-se promover ativamente a prevenção das doenças dentro do Plano Nacional de Vacinação, o desporto, a alimentação saudável, a educação para a vida em liberdade, a saúde mental e a valorização do indivíduo como ser único e especial em toda a sua plenitude.

O Estado deve ser neutro sobre os prestadores dos serviços, empoderando o indivíduo a escolher de forma livre e consciente entre toda a oferta disponível e que assim devem concorrer entre si através da qualidade ou da conveniência do serviço que prestam, excetuando-se as situações que requeiram atenção especializada de complexidade elevada e que requeiram que o saber esteja concentrado em centros de excelência de referenciação por parte de todos os servidores da saúde, e para onde serão canalizados esses doentes.

O Financiamento da Saúde, sendo muito complexo, tem de assegurar de uma forma simples que quem procura o sistema de saúde não seja barrado no tempo e no espaço aos cuidados de que necessita, e que quem oferece e presta os cuidados a quem o procura possa ser capaz de o providenciar e ser pago condignamente e atempadamente pelo ato praticado.

O papel do Estado na Saúde é o de estabelecer as prioridades, garantir o acesso de todos aos cuidados de saúde, assegurar, avaliar e monitorizar que os prestadores prestam os cuidados com qualidade, controlar os custos e assegurar que todos os prestadores possam ser pagos condignamente pelo seu trabalho e em concorrência saudável e simultaneamente possam ser avaliados e auditados no seu saber de forma a garantir a qualidade do Serviço Nacional de Saúde.

Todos os organismos do Estado que congregam saber, engenho e arte,  como a DGS, o INFARMED, a ERS e as organizações profissionais e as sociedades médicas e de saúde são  muito importantes no aconselhamento independente e no estabelecimento das políticas de saúde, pelo que devem ser encorajadas e modernizadas de forma a poderem exercer as suas funções e poderem exercer a sua influência científica e de aconselhamento das políticas de forma transparente e eficaz

Parte do financiamento da Saúde deve ser promovido também através da implementação de estudos clínicos e de investigação em tecnologias da saúde empoderando os Centros Universitários e outros de Investigação Clínica existentes ou a serem criados em Portugal na integração ativa e autónoma nas redes europeias de investigação científica que com enorme sucesso tem sido  implementado pela União Europeia.

Por outro lado o conhecimento profundo do estado de saúde dos portugueses deve passar pela integração dos sistemas de informação da rede de saúde nacional pública e privada, num sistema integrado e único e que possa, respeitando em absoluto as leis de proteção de dados pessoais, ser cruzado e acedido pelos profissionais de saúde para que devidamente enquadrado possa ser uma ferramenta primordial no estabelecimento das prioridades e das políticas de saúde aliando todo este conhecimento com os novos desenvolvimentos relacionados com a inteligência artificial e ao mesmo tempo os dados agregados ai estacionados possam ser usados em estudos integrados, nacionais e internacionais, sobre as mais diversas áreas, e ao mesmo tempo usados para se avaliarem os recursos investidos, auditar os protagonistas e ajudar os decisores nas políticas de saúde do futuro

As instituições de saúde públicas devem ser dotadas de recursos humanos adequados nas áreas prestadoras, mas também nas áreas de gestão de forma a que os recursos possam ser usados criteriosamente, sem desperdícios e com o máximo de retorno, em perfeita harmonia pelo respeito do dinheiro dos contribuintes.

Os ganhos em saúde fazem-se através da inovação e da ciência e os doentes em Portugal devem ter acesso a ela logo que a evidência científica, determinada por comissões independentes de avaliação da inovação em saúde, devidamente empoderadas, remuneradas e transparentes nas suas atempadas decisões assegurando que nenhum doente possa ficar para trás na esperança e na sua dignidade e pelo direto à Saúde, consagrado na Constituição.

O Estado deve abster-se de continuamente tentar de ser a solução, centralizando no Ministério da Saúde, qual politburo soviético que acha que tudo pode resolver, para ser um centro de pensamento e de reflexão sobre a saúde do hoje e de ontem e como ela poderá ser  a alavanca estratégica de como deve ser a saúde do amanhã.

Conseguimos com o SNS e o nosso progresso como nação de colocar a esperança de vida acima dos 80 anos para homens e mulheres e poderemos talvez num futuro muito próximo estar a falar  de esperança de vida próxima dos 100 anos com qualidade e livre de doença a maior parte do tempo.

Resta agora perceber como poderemos financiar um sistema destes com base na Liberdade do Indivíduo e na Liberdade do Prestador em que todos possam sair a ganhar e prosperar e com isso esta nossa grande Nação Valente e Imortal e que será o tema da Parte II deste singelo contributo para a reflexão de como poderemos reorientar a Saúde em Portugal para o Século XXI.

Um adeus português

Musk, um dos homens mais ricos do mundo, e um elemento-chave da nova equipa governativa americana, decidiu juntar à sua impressionante ação empresarial a intervenção ativa na política interna de diversos países. No papel de “influenciador” global apoiado pelas redes sociais, desvaloriza fronteiras, e interage com aqueles de que discorda, ou que detesta, quer se trate do líder da direita nacionalista britânica Farage, ou do social-democrata alemão Scholz. Dada a sua história de vida, devemos levá-lo a sério porque estes atos, que parecem insensatos, podem ser o vislumbre de uma nova era.

Vemos assim quebrada a separação hoje existente entre os domínios nacional e internacional na condução da política e da lei, que está delimitada pela ideia de soberania. A constituição de Estados e a atribuição da autoridade a uma pessoa, ou a um coletivo de pessoas, para determinar e aplicar a lei, foi um conceito fundador que marcou a construção das nacionalidades. Os países politicamente estáveis são um universo de partilha de riscos e de vantagens, que os cidadãos reconhecem, e o patriotismo, apesar de ter conhecido melhores tempos, e ter sido parcialmente relegado para os acontecimentos desportivos, ainda existe. É por isso que a relação entre países é gerida de uma forma diferente, e a ingerência noutro país é considerada uma ofensa a esta ordem mundial.

Será que as redes sociais e a globalização digital já erodiram completamente os conceitos de soberania, interesse nacional, e autodeterminação? É verdade que o policiamento do discurso público e a dificuldade de as nações europeias assumirem por inteiro o seu passado e os seus símbolos, é meio caminho andado para o seu fim. É também verdade que a globalização, com todos as vantagens económicas que trouxe, contribuiu para a menorização do valor da solidariedade nacional. Que os grandes fluxos migratórios criam questões adicionais de perca de identidade cultural. E que na Europa a criação incompleta de uma União, de geometria crescente e instável, juntou mais umas achas a esta fogueira, com constantes oscilações entre a europa das regiões e a europa dos países e a inexistência de facto de “patriotismo europeu”.

Não por acaso a ação de Musk acontece ao mesmo tempo em que se observa a erosão do papel mediador das Nações Unidas no consenso entre Estados. A ONU cultivou a igualdade entre as nações como princípio, e as melhores intenções num sentido muito ocidental. Procurou controlar conflitos e proteger populações, foi intransigente nas palavras, e chegou a movimentar forças significativas no terreno, tendo tido um papel central nas últimas oito décadas. Estruturada a partir da correlação de forças que saiu da segunda guerra mundial num mundo muito eurocêntrico, tem-se mostrado incapaz de lidar com os novos poderes, agora que as antigas “potências” defensoras da democracia liberal se reduzem à sua real dimensão.

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Com todos os seus defeitos, uma ordem mundial equilibrada precisa de se basear na defesa do valor das nações e da sua cultura, e na procura de entendimentos entre estas e entre comunidades que pensam e agem de forma diferente, aceitando-se essas diferenças. O entendimento pode basear-se apenas na negociação dos interesses próprios, à semelhança do que ocorre no mundo empresarial ou desportivo, ou carregar em si considerações de outra índole: morais, éticas, antropológicas, que sei eu.

O apagamento do papel da ONU e a multiplicação de fóruns alternativos do tipo “G qualquer coisa”, com mais ou menos países é um sintoma de uma doença grave do sistema internacional que urge colmatar.

A intervenção direta de alguém que tem um papel muito importante na administração americana, nas escolhas políticas de países europeus que teoricamente são os seus melhores aliados, parece ser um fator de instabilidade. Poderá ser uma situação pontual, e a marca de um estilo muito pessoal, ou então uma nova regra que se está a consolidar. Na verdade, ocupa um espaço que está vazio, uma autoridade que falta, e ainda é muito cedo para ser qualificada. Cabe à Europa repor a sua autoridade. Cabe a Portugal não esquecer nem a sua ligação europeia nem a sua geografia atlântica.

As nações, como as conhecemos hoje, poderão ser um modelo que a realidade vai ultrapassar. A criação de grandes blocos geopolíticos como atores únicos da política mundial passa necessariamente pelo esbater das diferenças entre as nações que os compõem, reescrevendo-se o passado em nome de um futuro comum. Se tal acontecer uma parte muito importante da nossa identidade e da nossa liberdade ir-se-á perder.

Reclama-se uma nova ordem mundial, mas ela será bem diferente das expetativas. As opções são muitas, mas nenhuma parece realmente melhor que o passado recente. Longe de um sistema assente em democracias liberais, e um mecanismo consensual de resolução de diferendos, todas as opções estão em aberto e todos os fantasmas do passado estão prontos para entrar em cena, e desejosos de o fazer.

Despedimo-nos da herança da Segunda Guerra com um adeus quase de saudade. A implacável “política real” já chegou ao extremo de o Secretário-Geral da ONU ser declarado “persona non grata” pelo governo de Israel, no meio de um conflito onde não conseguiu ter qualquer papel relevante. Movemo-nos num ambiente viscoso de que se não vislumbra o fim. Como num pântano. É difícil evitar a provocação: onde é que já ouvimos isto?

Ana Gomes: “Rixas há imensas no Martim Moniz. Mas também há entre adeptos de diferentes clubes, e não os vejo a ser encostados à parede”

“Há uma grande insensibilidade nas palavras do Almirante. O investimento nas forças armadas não deve ser feito à custa do Estado Social, mas da sinergia com o resto da Europa”, é assim que Ana Gomes abre o seu espaço de comentário esta semana. Referindo-se à entrevista dada pelo possível candidato às presidenciais no festival de podcasts do Expresso deixa outras sugestões para a gestão das forças armadas, tema premente num mundo que se mostra cada vez mais instável desde as declarações de interesse expansionistas de Donald Trump quanto à Gronelândia, Canadá e Panamá. Há ainda tempo para comentar as rixas recentes no Martim Moniz e a manifestação contra o racismo deste sábado, como os avanços recentes da lei aos solos no Parlamento. Ouça aqui o programa em podcast, emitido na SIC Notícias a 12 de janeiro.

A opinião de Ana Gomes. Ao domingo à noite tem encontro marcado na SIC Notícias para analisar os temas que marcam a semana. Ouça mais episódios:

O que é isso de revolução sexual? (1)

Regressemos a Rob Henderson e à sua expressão “convicções de luxo”. No seu artigo, Henderson explica que a ideia surgiu quando uma colega da Universidade de Yale lhe disse que “a monogamia se tinha tornado obsoleta e não seria boa para a sociedade”. Considerando a complicada infância que tinha tido, Henderson ficou surpreendido com esta posição e perguntou à colega pelo seu contexto familiar e se planeava casar. E, sim, a colega vinha de uma família estável e rica e pretendia ter um casamento monogâmico – “mas acrescentou rapidamente que o casamento não tem de valer para todos”.

Considerar que todas as estruturas familiares são igualmente válidas – uma posição que as elites intelectuais progressistas tendem a defender – constitui, para Henderson, uma típica convicção de luxo: uma ideia que defendemos para nos dar prestígio social, mas que, consideradas as suas consequências negativas, não pretendemos pessoalmente pôr em prática. Contudo, como são defendidas pelas elites, estas ideias tendem a influenciar a cultura e as normas sociais pelo que os seus impactos passam a ser sentidos pelas classes socais mais desfavorecidas.

É precisamente o que acontece com a desvalorização social do casamento enquanto compromisso estável e duradouro entre duas pessoas. Afinal,

“[o]s dados provam que as famílias com dois pais casados são as mais benéficas para as crianças pequenas. E, no entanto, é mais provável que pessoas ricas, educadas e criadas por dois pais casados defendam que a monogamia está ultrapassada, o casamento é uma farsa ou que todas as formas familiares são iguais.”

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Brad Wilcox, diretor do National Marriage Project da Universidade da Virginia e que publicou, em 2024, o livro Get Married: Why Americans Must Defy the Elites, Forge Strong Families, and Save Civilization, denuncia esta atitude das elites como uma terrível hipocrisia:

“Muitas elites – professores, jornalistas, educadores e outros formadores de cultura – desconsideram ou negam publicamente a importância do casamento, da família de dois pais e o valor de fazer tudo o que for possível para “ficar juntos para o bem das crianças”, apesar de, em privado, valorizarem cada uma destas coisas. Em matéria de família, “falam à esquerda”, mas “andam à direita” – uma forma invulgar de hipocrisia que, por muito bem-intencionada que seja, contribui para a desigualdade norte-americana, aumenta a miséria e raia o imoral.”

Para compreendermos de que modo a ideia da obsolescência do casamento se popularizou entre as elites progressistas norte-americanas, temos de regressar às décadas de 1960 e 1970 e identificar o espírito de contracultura daqueles anos. No Ocidente, a geração que tinha nascido após a segunda guerra mundial revoltava-se contra os valores conservadores da chamada “geração silenciosa”, que tinha, silenciosamente, sofrido o impacto das guerras e triunfado. Nascidos num conforto material incomparável, esses jovens chegaram às universidades desejosos de mais liberdade e igualdade e indisponíveis para participar em incursões militares. A revolta era direcionada contra as hierarquias e todas as formas de manifestação de poder e autoridade, entendidas como opressoras da liberdade individual – um sentimento consagrado em Paris com um dos slogans mais relevantes do Maio de 68: “É proibido proibir.”

No meio académico, as influências combinavam princípios marxistas, intuições estruturalistas e, em particular, a defesa freudiana da libertação das pulsões biológicas, nomeadamente sexuais – uma mistura representada especialmente bem por Herbert Marcuse, considerado o pai da Nova Esquerda.

É este espírito de libertação que dá forma à designada revolução sexual, que visava libertar corpos e mentes das regras sociais que determinavam o que era ou não admissível na esfera do corpo, nas relações e na família. E libertaria, em particular, a mulher, como proclamado por Germaine Greer, em 1970, com a publicação de The Female Eunuch.

Estávamos em plena segunda vaga do feminismo e, nesse contexto, a família era apresentada como estrutura social particularmente opressora para a mulher, em resultado da sua essência burguesa e patriarcal. Emancipar a mulher e garantir a sua condição de igualdade parecia assim requerer uma redefinição (para alguns, mesmo a destruição) da instituição familiar, para que desses escombros pudessem surgir novas formas de organização menos sujeitas à lógica do “casamento tradicional”. Foram estas ideias que se tornaram culturalmente populares, simbolizando a abertura de espírito e o avanço do arco moral em direção ao progresso e que continuam a ser usadas pelas elites intelectuais e económicas para simbolizar o espírito progressista.

No entanto, ao mesmo tempo que tinham este discurso público, as elites continuaram a constituir família no contexto de um casamento monogâmico e estável, com o seguinte resultado registado nos Estados Unidos: desde a década de 1960, os casamentos diminuíram, os divórcios aumentaram e as famílias monoparentais multiplicaram-se… em particular nas classes trabalhadoras e pobres. E é esta discrepância que tem vindo a ser designada como “gap familiar” entre os mais ricos e os mais pobres, com especiais consequências para as crianças. Como diz o sociólogo Andrew Cherlin: “São os norte-americanos privilegiados que se casam, e o casamento ajuda-os a manterem-se privilegiados”.

Esse fosso familiar é tão evidente que Melissa Kearney publicou, em 2023, um livro intitulado The Two-Parent Privilege para revelar como a questão familiar constitui um dos fatores mais relevantes do problema das desigualdades económicas nos Estados Unidos. De facto,

“a investigação mostra que as crianças de lares com pais casados tendem a apresentar menos problemas de comportamento, a ter menos sarilhos na escola ou com a lei, a atingir níveis de educação mais elevados, a obter rendimentos mais elevados e a ter taxas mais elevadas de casamento.”

E, como já vimos, as consequências são ainda mais graves para os rapazes. De acordo com o Institute for Family Studies, os jovens que cresceram sem a presença do pai biológico estão mais ausentes das universidades e do mercado de trabalho e mais presentes nas prisões.

O tema não é, na verdade, novo. Em 1965, Daniel Patrick Moynihan publicou o famoso Relatório Moynihan (que se tornaria politicamente inaceitável) e Isabel Sawhill dedicou décadas de investigação à causa familiar (há quem entenda que o livro Generation Unbound, publicado em 2014, é a sua desistência). Mas a consistência dos estudos que continuam a ser feitos e uma certa resposta contra-cultural têm permitido colocar o assunto na ordem do dia com mais pertinência.

Consideremos o trabalho de Brad Wilcox em torno da designada “sequência de sucesso” para que uma nova narrativa cultural substitua aquela que desvaloriza o casamento. De acordo com as suas investigações, a melhor forma de os membros das classes pobres aumentarem a sua mobilidade social é percorrerem os seguintes passos: 1) terminar, pelo menos, o ensino secundário; 2) trabalhar a tempo inteiro enquanto se está na casa dos 20 anos; e 3) casar antes de ter filhos. Esta é também a melhor fórmula de evitar que as crianças cresçam em contexto de pobreza.

Esta nova narrativa deveria, assim, ser enquadrada nas reflexões mais amplas de combate à pobreza, e é particularmente importante entre as classes mais desfavorecidas e com menos estudos. Como os investigadores notam, nos meios mais abastados, os pais tendem a esforçar-se mais para manter o casamento, mesmo com todas as dificuldades e problemas pessoais, por causa das crianças. É junto dos outros grupos sociais que o divórcio é mais recorrente.

Mas o casamento não constitui apenas uma vantagem económica: de acordo com o estudo realizado por Sam Peltzman sobre “demografia social e política da felicidade”, as pessoas casadas são mais felizes do que as solteiras; outro estudo revela que o casamento parece ajudar a prevenir as “deaths of despair”; e Kay Hymowitz remete para “o inextinguível impulso humano para a união de pares” que ajuda a explicar a persistência da família nuclear ao longo da história da humanidade e a satisfação por ela gerada.

Existem, claro, situações graves em que o casamento não se deve manter – em particular quando há crianças envolvidas (o argumento funciona, nesses casos, ao contrário). Mas, sessenta anos volvidos sobre a alegria esfuziante e libertadora da revolução sexual, estamos hoje no momento de reavaliar as suas consequências e compreender melhor o preço que, como indivíduos e sociedade, estamos a pagar, nomeadamente, na perda de sentido e felicidade.

Afinal, como diz Christine Emba, no seu maravilhoso Rethinking Sex: “Podemos desejar liberdade hoje, mas queremos sentido amanhã e para o resto das nossas vidas.”

Real Madrid-Barcelona, 2-5: Culés demasiado fortes limpam a Supertaça

O Barcelona foi demasiado forte para o Real Madrid em Jedá, na Arábia Saudita, e ali conquistou pela 15.ª vez a Supertaça de Espanha. Ninguém arrecadou mais vezes o troféu! Hansi Flick, esse, provou ser uma espé…

Por Nuno Pombo

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Crise na Educação em Portugal: uma geração em risco

Portugal enfrenta um paradoxo preocupante no seu sistema educativo. Apesar de celebrarmos taxas recordes de jovens a concluir o ensino superior, a realidade nas escolas pinta um cenário inquietante: estamos a formar uma geração de alunos com diplomas, mas sem a devida preparação para os desafios do mundo real.

Esta constatação não se baseia em meras impressões. Testemunhei em primeira mão, como orador num webinar recente da Direção-Geral da Educação, o fosso abissal entre as estatísticas otimistas e o panorama desolador que se vive nas salas de aula. Os resultados dos testes PISA e TIMSS, que avaliam o desempenho dos estudantes portugueses em comparação com outros países, são incontestáveis: estamos em queda livre.

O relatório “Estado da Nação” corrobora esta preocupante realidade, evidenciando a fragilidade do nosso sistema educativo. O Conselho Nacional de Educação (CNE) alerta para a gravidade da situação: alunos progridem nos seus percursos académicos sem dominarem competências essenciais de Português e Matemática, colocando em causa a sua capacidade de aprendizagem futura. Esta falha, particularmente notória nos primeiros anos de escolaridade, condena muitos jovens a um ciclo de dificuldades e frustrações.

Agrava-se este cenário a postura retrógrada da atual liderança do CNE, que teima em apresentar propostas anacrónicas e desalinhadas face às necessidades prementes da educação no século XXI. As políticas educativas dos últimos anos, fortemente influenciadas por esta visão obsoleta, conduziram a resultados desastrosos, perpetuando um ciclo vicioso de mediocridade.

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O facilitismo que se instalou no sistema educativo português, com a promoção automática e a ausência de consequências para o insucesso escolar, desvalorizou o mérito e a cultura do esforço. A falta de rigor na avaliação e a tolerância à mediocridade criaram uma geração de estudantes desprovidos de ferramentas essenciais para o sucesso académico e profissional.

É imperativo que Portugal promova uma verdadeira revolução na educação, quebrando com os dogmas do passado e construindo um novo paradigma. Uma educação que valorize o esforço e o mérito, reconhecendo e premiando o trabalho árduo e a dedicação dos alunos, incentivando-os a alcançar o seu máximo potencial. Que estabeleça padrões de exigência claros e mensuráveis, definindo metas ambiciosas e implementando mecanismos de avaliação rigorosos que permitam monitorizar o progresso dos alunos de forma transparente. Uma educação que prepare os alunos para os desafios do século XXI, dotando-os das competências essenciais para navegar num mundo em constante mudança, com foco no pensamento crítico, na criatividade, na colaboração e na capacidade de adaptação. Que implemente métodos pedagógicos baseados em evidências científicas, abandonando as ideologias e modismos, e privilegiando abordagens pedagógicas comprovadamente eficazes.

A educação em Portugal não pode continuar refém de ideias ultrapassadas. É crucial uma liderança educativa visionária, capaz de interpretar os desafios contemporâneos e de implementar reformas estruturais profundas. O futuro do país depende de uma educação de qualidade, que forme cidadãos capazes, críticos e responsáveis, e não de diplomas vazios que mascaram uma geração perdida.

Elon Musk deve fazer política ou ser silenciado?

A questão de saber se os apoios e críticas declarados por Elon Musk no X constituem um abuso de influência ou um exercício legítimo da liberdade de expressão assenta em dilemas filosóficos mais profundos que um tweet. O vasto alcance de Musk permite-lhe moldar o discurso público de maneiras que poucos indivíduos conseguem, deixando-nos polarizados quanto às restrições de tal poder. Contudo, limitar a sua voz ameaça o princípio fundamental da liberdade de expressão?

Este dilema pode ser analisado através de duas perspectivas aparentemente contrastantes: a defesa apaixonada de Voltaire pela liberdade de expressão, e o rigoroso enquadramento moral de Kant.

Para Voltaire, o direito de expressar ideias, independentemente de serem controversas ou disruptivas, é o cerne da liberdade. Poderia argumentar que a influência de Musk, embora vasta, é simplesmente uma extensão natural da sua liberdade de se exprimir. Afinal, quem tem o poder de reivindicar o direito de decidir quais as vozes demasiado altas ou influentes? Provavelmente, Voltaire até celebraria as provocações de Musk, vendo-as como catalisadoras de diálogo, debate e, em última instância, do refinamento de ideias. Se os críticos de Musk consideram as suas palavras perigosas, não deveriam enfrentá-las com argumentos mais fortes, ao invés de pedirem o seu silêncio coercivo? Todavia, será possível defender estes axiomas num mundo tão diferente daquele do qual onde Voltaire os formulou?
A praça pública do século XVIII, idealizada por Voltaire, era um espaço de relativa igualdade, onde as ideias competiam abertamente. A plataforma de Musk, contudo, não é uma mera tribuna; é um megafone ouvido por centenas de milhões, amplificado por algoritmos que privilegiam o envolvimento em detrimento da razão. Poderá esta disparidade distorcer os princípios que Voltaire procurava proteger? Pode uma única voz, amplificada pela tecnologia, silenciar o coletivo? E, se sim, permitir uma influência tão desmedida serve a liberdade, ou corrói o próprio discurso que Voltaire tanto valorizava?

Já Kant, abordaria as ações de Musk com uma crítica diferente, enraizada na sua crença no dever moral e no respeito mútuo universal. O imperativo categórico de Kant — a ideia de que devemos agir apenas de formas que possam ser universalizadas — exigiria que Musk considerasse as implicações mais amplas das suas declarações. Será ético para alguém na posição de Musk, com uma influência incomparável, apoiar ou criticar líderes mundiais, sabendo que as suas palavras podem moldar eleições e percepções públicas? Para Kant, esta não é uma questão de direitos, mas de responsabilidades. A liberdade de expressão, na sua visão, não é uma licença absoluta; deve ser exercida de forma a respeitar a autonomia dos outros e a preservar a integridade dos processos democráticos.
Ainda assim, o enquadramento de Kant, embora nobre, apresenta os seus próprios desafios. Como se definem os limites da responsabilidade sem infringir a liberdade? Exigir que Musk seja sujeito a um padrão mais elevado por causa da sua influência restringe injustamente a sua autonomia? E quem decide o que constitui dano ou manipulação? A exigência de Kant por princípios universais corre o risco de nos mergulhar no paternalismo, sugerindo que os eleitores carecem de capacidade para discernir a verdade da influência. Mas, se assumirmos a sua autonomia, isso não implica que Musk tenha o mesmo direito de se expressar como qualquer outro indivíduo, independentemente do seu alcance?

Este debate deixa-nos, felizmente, com mais perguntas do que respostas. Se ficarmos ao lado de Voltaire, teremos de lidar com as consequências de uma influência desenfreada num mundo onde as plataformas amplificam vozes de forma desigual. Apoiando Kant, arriscamo-nos a introduzir padrões vagos de responsabilidade que podem sufocar a expressão e tender para a censura.

Talvez o verdadeiro desafio não esteja em escolher entre liberdade e responsabilidade, mas em redefini-las para a era digital. Que tipo de sociedade desejamos cultivar — um mercado caótico de ideias, onde todas as vozes, por mais altas que sejam, competem livremente? Ou uma onde aqueles com grande poder são sujeitos a padrões mais elevados, mesmo à custa da sua liberdade? A resposta, talvez, resida no meio da tensão entre estes ideais, uma tensão que reflete a própria natureza da democracia.

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Bairros de lata na Grande Lisboa Sim, existem

Muitos se recordam da vergonha e do desconforto que sentíamos, quando entrávamos em Lisboa,  vindos do norte, e nos deparávamos com bairros de lata onde a degradação urbana e a pobreza das  pessoas que ali viviam era evidente. Muito se fez nos anos 90 para contrariar essa tendência, na  criação de bairros sociais que efetivamente alojaram milhares de pessoas, mas que criaram novos  problemas cujas consequências hoje em dia estão à vista. Assim, alguém que não conheça a atual  realidade, pode pensar: não existem mais bairros de lata em Lisboa! Mais, não há mais barracas na  Área Metropolitana de Lisboa, construídas de forma desordenada e onde a pobreza, falta de higiene e  a insegurança são a consequência natural deste contexto.

Lamentamos informar, mas não! É uma situação que permanece! Não talvez em Lisboa, concelho,  mas por toda a Área Metropolitana de Lisboa, em particular no de Almada. Desde que Inês de  Medeiros, do Partido Socialista, assumiu a presidência da Câmara Municipal de Almada em 2017, e  com a conivência do PSD, veio ao de cima a sua incapacidade em lidar com os problemas estruturais  de Almada, sobretudo no que diz respeito à habitação e ao crescimento de bairros clandestinos.  Enquanto a CDU deixou a sua marca de negligência ao longo de quatro décadas, com o crescimento  dos bairros do 2.º Torrão e das terras de Lelo Martins (vulgarmente conhecido por Terras da Costa), e  o BE promove a ocupação ilegal de casas municipais para beneficiar de narrativas políticas e manipulação de eleitorado, o atual executivo PS agravou a situação, permitindo o descontrolo total em  bairros como a Penajóia e tratando de forma desumana as populações vulneráveis nos outros dois  bairros.

Recentemente e apenas por motivos de segurança, devido ao risco de derrocada de parte do bairro,  parte da população do 2.º Torrão teve de ser realojada. A abordagem de Inês de Medeiros no  realojamento das famílias do 2.º Torrão foi marcada pela pressa, pela insensibilidade e pela falta de  planeamento. O PS, sob o pretexto de garantir a segurança pública, avançou com demolições  apressadas em 2022, deixando dezenas de famílias desalojadas ou colocadas em habitações  temporárias longe das suas redes de apoio. O mesmo padrão de negligência verificou-se nas Terras  da Costa, onde o problema da precariedade habitacional permanece inalterado. Este governo local  falhou em tratar estas populações com dignidade, preferindo uma abordagem cosmética que privilegia  o “apagar de fogos” mediáticos, ao invés vez de soluções reais e integradas.

Porém, o maior símbolo da incompetência da liderança socialista é, sem dúvida, o bairro da Penajóia.  Nos últimos anos, o bairro cresceu de forma desordenada. O município assistiu de forma impávida e  serena ao crescimento de construções clandestinas. Imagine-se o efeito perverso de, no próximo ciclo eleitoral autárquico, abordar a população da Penajóia com a promessa de novas casas quando, na  verdade, a CMA teve a oportunidade de estancar o problema. É desconcertante. Na semana do Natal  de 2024, a falta de eletricidade no bairro expôs a verdadeira face do desleixo do executivo PS: famílias  deixadas ao frio, numa altura crítica do ano, sem respostas nem assistência.

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Apesar de estar localizado em terrenos do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), é  à Câmara que cabe a responsabilidade de fiscalizar, coordenar e intervir. No entanto, Inês de Medeiros  e o seu executivo têm assistido passivamente à expansão descontrolada da Penajóia, permitindo que  o bairro se transforme num exemplo de exclusão social e falta de dignidade humana.

Esta inação do PS contrasta com as promessas eleitorais de mudança e modernização. Em vez disso,  o mandato de Inês de Medeiros, acolitada pelo PSD, ficará marcado pela incapacidade de tomar  decisões corajosas e eficazes para resolver um problema que não pode mais ser ignorado.

Perante este cenário, Almada precisa urgentemente de uma visão política que vá além da mera gestão  do presente. É preciso pensar em quais as respostas que o município pode dar a uma população que  dificilmente terá meios para, no curto prazo, entrar no mercado da habitação. A política de construção  de bairros sociais, verdadeiros guetos, é insuficiente no que diz respeito à integração das pessoas na  comunidade. Assim, importa estimular parcerias público-privadas para requalificar áreas degradadas,  sem sacrificar o direito à segurança e à habitação digna, mas que responsabilize, ao mesmo tempo,  os moradores pela falta de civismo e até vandalização do edificado.

Igualmente, os serviços municipais, suportados com os impostos dos munícipes, da mesma forma que  fiscalizam e obstaculizam as centenas ou milhares de vivendas que estão a ser construídas de forma  legal em Almada, devem ser direcionados para impedir o crescimento dos atuais bairros e o surgimento  de novos. Com isto, os agentes públicos que falham em cumprir o seu papel devem ser  responsabilizados. Os realojamentos que ocorrerem, de forma a não criarem novos guetos, devem  prever o acesso a transportes, saúde, educação, e, sim, segurança. A ausência da autoridade do  Estado, naquilo que este é realmente necessário, a saber, a proteção das pessoas e dos bens públicos  e privados, é o que produz episódios de violência como os que assistimos recentemente em toda a  Grande Lisboa, também em Almada, mais concretamente no Monte da Caparica. Não podemos cair  nos mesmos erros e daqui a alguns anos nos chocarmos com episódios de violência que ocorram em  novos guetos.

Por fim, dar espaço para a criação de oportunidades para que as populações vulneráveis possam  ascender social e economicamente, e isto faz-se, a médio/longo prazo, por via da educação, mas, no curto prazo, no apoio à criação do pequeno negócio local. Seja pela responsabilidade de manter um  imóvel, seja pela responsabilidade de gerir um pequeno negócio que permita o sustento do seu dono  e de mais alguém da comunidade local, esta é a forma mais eficaz de criar um dinamismo e uma  consciência tal que ajudará a integrar as pessoas e desviar muitos da exclusão e da criminalidade.

O que foi descrito para Almada, poderia ser descrito para outros concelhos da Área Metropolitana de  Lisboa, pois a realidade é a mesma. Substituir Almada por Seixal, Loures ou Amadora não resultaria  num texto muito diferente. Tal deve-se a um traço comum – as políticas locais falhadas do PCP e do  PS, que, desde o 25 de Abril, governam estes municípios, alternando a negligência de uns com a  incompetência de outros. À gestão do PCP em alguns destes concelhos, sucederam-se executivos do  PS que perpetuaram problemas e assistiram, de braços cruzados, ao colapso da dignidade  habitacional nestes concelhos. Só uma nova abordagem, assente na responsabilidade política dos  eleitos, das pessoas e na liberdade individual destas, poderá reverter um cenário que, tal como no  passado, mas talvez mais escondido, nos envergonha a todos.

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