Tribunal mantém Rui Pinto em liberdade e perdoa-lhe indemnização no Football Leaks
A uma semana do seu segundo julgamento, Rui Pinto sabe que a decisão do recurso do caso Football Leaks o mantém em liberdade e o livra de pagar uma indemnização de três mil euros à Doyen, decidida em primeira instância. Depois de o Ministério Público (MP) ter decidido não recorrer da pena suspensa aplicada em Setembro de 2023, o pirata informático e testemunha protegida vê o Tribunal da Relação de Lisboa rejeitar os recursos de agravamento de sanção apresentado pelos advogados Rui Medeiros, Inês Almeida Costa e Rui Pereira.
No acórdão a que o PÚBLICO teve acesso, o Tribunal da Relação de Lisboa mantém, desta forma, a pena suspensa aplicada a Rui Pinto por tentativa de extorsão e vários crimes de pirataria informática. O hacker havia sido condenado em primeira instância a quatro anos de pena suspensa em Setembro de 2023, tendo sido amnistiado de 68 crimes graças à vinda do Papa a Portugal na Jornada Mundial da Juventude.
O tribunal decidiu ainda na altura que o arguido teria de pagar várias indemnizações às pessoas e instituições que lesou, num total superior a 22 mil euros. A maior fatia cabia ao advogado João Medeiros, que viu o seu correio electrónico devassado, com graves consequências para a sua vida pessoal e profissional.
O delito mais grave cometido pelo pirata informático foi ter tentado extorquir dinheiro ao fundo de investimento Doyen, com um plano conhecido e secundado pelo advogado Aníbal Pinto. Para parar de publicar no site Football Leaks documentos confidenciais da Doyen relacionados com passes de jogadores e empréstimos deste fundo de investimento aos clubes, o pirata informático chegou a exigir em 2015 a esta entidade uma verba entre meio milhão e um milhão de euros.
Mas Rui Pinto também foi condenado por ter acedido de forma ilegítima aos sistemas informáticos do Sporting, da Federação Portuguesa de Futebol, da Procuradoria-Geral da República e do escritório de advogados PLMJ, além da Doyen.
Outros actos de pirataria informática de que o hacker também é suspeito fazem com que se vá sentar novamente no banco dos réus a partir da próxima segunda-feira, num segundo julgamento em que é acusado de 242 crimes relacionados com o acesso a emails do Benfica, FC Porto e outros clubes, organismos do Estado, juízes, procuradores, empresas de Isabel dos Santos, escritórios de advogados, jornalistas do grupo Cofina — que integra os jornais Correio da Manhã e o Record – e ainda da Igreja Universal do Reino de Deus.
Nem a Autoridade Tributária escapou a Rui Pinto, que acedeu pelo menos 172 vezes ao domínio “at.gov.pt” sem ser notado, durante vários meses. Em Março de 2017 entrou no sistema com as credenciais da directora-geral deste organismo, Helena Alves Borges. Rui Pinto vai ser julgado outra vez por mais 242 novos crimes
A curiosidade de Rui Pinto levou-o ainda a “exfiltrar” o email do advogado de Cristiano Ronaldo, Carlos Osório de Castro. A caixa de correio electrónico continha, segundo o Ministério Público, “informação sobre processos judiciais ou outros em que figurava como interveniente Cristiano Ronaldo”.
A estrela internacional do futebol viu-se envolvida num caso de alegada violação, com a publicação germânica Der Spiegel a apontar um acordo de silêncio assinado entre o jogador e Kathryn Mayorga, a suposta vítima. A antiga modelo norte-americana afirmava que o jogador a teria obrigado a praticar sexo anal, no contexto de um encontro consensual, apesar de lhe ter pedido várias vezes que parasse. Ronaldo acabaria por não ser julgado e viria mesmo a ser indemnizado.
Também neste segundo processo o pirata informático beneficiou da amnistia: a justiça entendeu que, apesar de ter sido acusado de 377 delitos, o arguido tinha direito a ser perdoado de 134 crimes de menos gravidade, uma vez que ainda não tinha 31 anos quando violou a lei.